Sonho incessante e sórdido de sangue que suga o sol e o céu. Que mobiliza e morde, mórbido, deveras veloz a veia desse véu.
A dor, essa dinastia demente, detona e doma mais dor em minha mente e, dilacerando dentes e entrecortando entranhas, fulgura em flor, formas fáceis e estranhas.
Por plena e simples necessidade – ter teimosia in terna insanidade – devido ao dever destemido de domar o dom – abafar o fanho afã do negro som.
No sarcófago em que sucumbe a sanidade, Jaz o germe que gerencia a Aljubarrota: rastejante rosto, rodeando e rondando a rota, Débil de agora, dantes docilidade. (1995) ___________________________________________________________________________________ Unir as pontas da vidaEscrito há exatamente 20 anos (eu tinha 19), ele ficou "na gaveta" até então. O original desapareceu e eu ainda o lembro de cabeça. Ele foi mesmo feito para ser lembrado pela sua sonoridade.
Hoje, duas décadas depois, resolvi desovar o bicho. Acho que hoje eu o entendo. Não o havia publicado por se tratar de um poema muito caricato, paráfrase declarada dos versos de Augusto dos Anjos... Hoje, escrevendo minha tese sobre o poeta, vejo que algumas de minhas ideias atuais já estavam intuídas ali: "Convulsão" representa poeticamente alguns aspectos de minha investigação sobre a poesia de Augusto. Talvez não seja um bom poema, mas é uma interessante reflexão crítica sobre alguns efeitos musicais e imagéticos da poesia de Augusto dos Anjos.
O interessante é que eu, obviamente, não tinha tanta clareza quanto à influência de Augusto neste meu poema, quando o escrevi. Pode não parecer, mas é um poema sincero. Falava do meu eu também para além do Eu de Augusto. Lembro de quem fui e de como tudo que está nesse poema é extremamente sincero. Um poema sincero não necessariamente é um bom poema, mas sinceridade (não confundir com "verdade") é bastante coisa numa poesia. Hoje vejo nele a sinceridade de Augusto e também a de Piva, a de Manoel de Barros (ainda que não seja tão poderoso quanto os versos desses poetas). Note: "sinceridade" como quem diz "inteireza", ou ainda como quem diz "entrega".
Daí que ele leva às últimas consequências uma maneira de se conceber poesia: a música contamina o pensamento até que ele se apresente em sua imagem e em sua lógica. Às vezes, as últimas consequências podem ser desastrosas, mas o caminho pela "saturação" (overdrive) é sempre um caminho válido. (Acredito piamente nisso e o barato dessa pedagogia é transformar o ônus em bônus).
Hoje vejo nele a "minha dor de cabeça, meu medo da morte", vejo minhas seções de terapia que um dia me apresentaram a mim mesmo. Esse poema resistiu à minha crítica impiedosa e martelou na minha cabeça quando estava escrevendo minha tese. Foi testemunha, agente e resíduo daquilo que fui. Ele foi capaz de dizer para mim - há 20 anos atrás - quem eu seria; ele traiu minha mania de perfeição e se impôs com sua música, me alertando sobre algo que a gente aprende quando escreve uma tese: a luta contra a mediocridade é uma luta eterna.
Se veio com tanta teimosia, que venha.
"Quem tem que vir que venha, quem tem que ir, que vá" (André Abujamra - Karnak)
Toma teu rumo, poeta. Trabalha, chora, peida, vive. Não tem nada, na certa, que tu tenhas que ninguém tive.
Trabalhas, poeta, e defende teu futebol no declive. Sobe morro, desce esporro que teu coração partícipe, só escreve do que à pena serve e só condiz com Nínive, se assim disser seu contracheque.
O mundo não espera, poeta, semeia derrotas, as tuas rimas tortas, quisera, de nada adianta diante das pragas que nascem no teu quintal.
Te apruma poeta, que quem corta não é a lâmina, é o samurai.
Funciona assim: todos – todos mesmo – já estavam quando Bapeloo não tinha aparecido.
Foi quando Ela fez que todos – disse todos! – inventassem que a partir dali Bapeloo era fundamental.
Surgiu as guerras, a fome, a internet e Bapeloo alimentava as contradições das pessoas até que se tornasse a grande puta amante da história.
A Bapeloo era aquela pedra no meio dos macacos em 2001.
Era a pílula vermelha e a azul. Nem Foucault, nem Agambem sacaram a Bapeloo, mas queriam...
Dizem que nos últimos dias, Augusto dos Anjos virá rir dos homens e das putas. Virá cavalgando um verme gigante (Moadib, príncipe de Araque) para fecundar a terra antibapeluana.
Quando os cromossomos retornarem, daí, a 46, dizem que Bapeloo volta com todos os seus sacerdotes, seus Edis, vomitando altares, regurgitando dízimos...
Ou quiçá, recalibrando o eterno-retorno, o homem aprenda a cavalgar a Bapeloo
...Porque a necessidade dos homens é necessária!
Quiçá a humanidade para além da humanidade venha num bater de asas.
Só que não. É ave Bapeloo, Amém!
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