segunda-feira, 24 de outubro de 2011

UKEMI


O Aikido é a doce arte na qual se aprende a amar o chão.

Reconhecer o solo como textura, como doçura: o aikidoista é o amigo do chão.

Quantas vezes as pessoas reclamam ou praguejam por suas quedas diárias? Entretanto, são as topadas e tropeços os grandes protagonistas de nossas vidas: são eles que nos trazem o imprevisto, que recortam nossos desejos de modo tão exato que transformam nossas mais ingênuas pretensões nas mais ásperas durezas do cotidiano. O dia-a-dia real é feito de tropeços, quedas, topadas.

Sem as “quedas” nossa vida seria ideal. E assim concluímos que nossos ideais estão errados, pois queremos uma vida sem “quedas”. Moramos num planeta, numa realidade que propõe duas questões inelutáveis: as coisas caem (chamemos gravidade), a vida finda (chamemos morte)... E vivemos uma vida que almeja vida eterna (quando o valor da vida é dado pela presença da morte) e esperamos um cotidiano que recuse os tropeços (quando é a queda que aponta o único e verdadeiro sentido para as coisas, a imprevisibilidade do chão).

Talvez haja, sim, nisso tudo, algo de oracular, já que é do solo que surge a vida. A gravidade é a força mágica que a todo o tempo nos aponta de onde viemos e para onde voltaremos. A vida é um fenômeno que parte do solo; se biblicamente temos que o homem veio do barro, concluiremos que foram necessárias duas coisas para a nossa vida: a terra (a massa mágica que constitui o chão) e a água (substância mágica que alimenta, que possibilita a vida, que cabe em qualquer canto, em qualquer vaso, que se adapta, que flui e, veja, sempre acompanha a gravidade).

O aikido é a arte de amar o solo

O aikido é a arte de aceitar o chão

Quem o chão aceita, vive com verdade a vida:

Não se vive a vida sem queda.

Quem o chão aceita vive com inteireza a vida:

Não se pode tudo saber só olhando para o céu.

Quem o chão aceita vive a vida plena:

Ser humano é se reconhecer nos percalços e nos tropeços da vida.

Quem faz aikido deve saber da queda,

Deve, na queda, encontrar-se.

Quantas vezes, de joelhos, a humanidade temeu os céus?

Mesmo em seiza, não percebiam a resposta:

Nem somente o céu, nem somente o chão...

O verdadeiro humano se faz como a água:

Flui entre a terra e o céu.

Fluir apesar da aridez do solo e,

fluindo, possibilitar a vida...

Isso é um ato de amor

Isso é Aikido


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Imagem colhida de: http://www.diburros.com.br/2009/06/aikido/ (Ao Marcelo Braga, muito obrigado!)

Veja também: http://www.diburros.com.br/

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Do Espelho


E o diabo saiu furioso,
do consultório
o médico havia pedido
por um simples “33”

Nada havia que anunciasse o apocalipse:
mas ele o fez por birra.
Para reencontrar seu objeto de ódio
para lavar com sangue seu manifesto de ira.

Seu mundo era verde,
e não vermelho como pensavam:
verde musgo, verde limo, verde longe, verde tédio,
Satanás era um inferno mais para si mesmo.

Por honra,
Expulsou todos os demais demos do paraíso:
Justo ele, o democrata.

No inferno, em boa companhia...
seria o paraíso...
O Paraíso.
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Imagem colhida em: http://www.encantosdeoxum.com/orixas.htm

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Missal


Um grupo de vagabundos na porta da festa
todos armados até os dentes.
muitos bêbados, todos crentes.
Todos batendo no vidro, querendo estar in.

Uma corja de vagabundos na porta da zona,
rezam pelas visões de Fátima,
uns praguejam, outros velejam
lêem maiakovsky na loja de conveniência.

Uma cátedra de burros na porta da missa,
restos de hóstia prá tomar com cerveja
um cisma com a missa, outro cisma com o Sismo

...E a igreja não cisma
e recolhem-se as doações.

Uma coleção de apátridas de fora, na porta do estádio
e fiéis, os corintianos perderam o jogo.

Uma coleção de cadáveres dentro do solo,
no velório, satisfeita
A família de corintianos vivia a catarse:
justiça feita,
adeus aos pés-frios das portas e Igrejas.
__________________________________________________.
Imagem colhida em:http://jorgemiguelcs.wordpress.com/category/m-c-escher/


domingo, 25 de setembro de 2011

De Saturno ao Retorno


Poeta é o sujeito que foi atropelado
pela ambulância. Na porta do supermercado
mas todas as garrafas de cerveja foram poupadas.

Eu não quero mais fazer poesia. Medo
tenho medo, tenho medo
das ambulâncias do destino querendo tomar minha cerveja.

Não quero mais a beleza
da vida. Quero sanar a dívida, pagar a conta
ganhar salário para o resto da vida
dormir quentinho protegido
da miséria do meu dia-a-dia.

Da miséria do meu trabalho escravo
da verdade inelutável e sorrateira e inviolável de
meu cheque especial, da fatura do cartão de minha
vida de poeta sem crédito algum.

A solução para nossa vida está em Encélado:
a arquiteta dos anéis de saturno,
Nossa Senhora das Dores, veste o manto dos anéis
quando sai para passear: recebe o nome ressonância orbital.

Na gigantomaquia do dia-a-dia
mesmo Encélado perde a guerra e Atenas
o aprisiona na Cicília.

Se nem os gigantes podem contra os deuses,
o que poderá o meu coração?

____________________________________.
Imagem colhida em: http://devorador-d6-pecado.blogspot.com/2010/11/sexta-lua-de-saturnoencelado.html

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A Sociedade sem poetas mortos.

Menino 10 anos mata professora, suicida-se.
alguns dizem que foi por amor,
outros por nota,
outros, que tem café no bullying.

O tiro, no fígado
da professora se regenera
a cabeça regenera não
o tiro no menino nos tímpanos.


Ao mundo, do Real ao realengo


Nossa Senhora de Columbine,
quantos tiros, quantos meninos serão necessários
Para que o mundo entenda
que a educação Prometeu.

______________________________.
imagem colhida de http://percepolegatto.wordpress.com/2010/08/08/carpe-diem/

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Breaking all the rules



“Eu sou uma metralhadora em estado de graça”
Roberto Piva

O Rock´n´roll é a motosserra de Deus
E eu sou seu padre,
seu Jesus de pau duro.

A guitarra é hóstia,
pão, sangue, vinho...

E cálice nunca!

Riso da vida
gozo da morte...

A banda de Rock
é Santa Ceia onde todos
são Judas em estado de Graça.

Maria dança louca:
é Rita baiana em auto azevedo.

Pedro, padre, é pobre Podre

Madalena, assutada, corre para detrás do templo
donde se ouve: – No Mercy!

E o assoalho, pantanoso em galera, escorre
Cristo crucificado em santo stage dive.

Satã fuma um Havana no camarote entre putas
enquanto Gabriel e Miguel, bichinhas enfurecidas,
chafurdam na roda punk,
perdidos na multidão.

E eu ofereço meu sangue, meus dedos,
meus ossos e palheta em nome do ostensório – minha guitarra

Minha garganta está rouca
meu sorriso é gárgula...

...Mas continuo:
em holocausto dedico à plateia meu gozo

À turba de bárbaros...

Porque Deus esmerilha certo por cordas tortas.

Justo! A voz do povo
É rock de Deus.

(Para Drei Bressan & Du Bonfá)

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Agradecimento pela imagem colhida no Blog "Baú do Edu" (http://obaudoedu.blogspot.com/)


quarta-feira, 3 de agosto de 2011

A um Poema


Nem por glórias ou memórias:
eu te fiz, poema,
para saciar minha dor.

Para libertar meu ódio,
para velejar em canção.

Eu te fiz, poema,
pra que desculpasse minha vida
pelo que não sou, pelo que não fui.

Para que fosse ao mundo
fecundar as gentes,
me traindo e traindo,
até que aprendesse amar.

Para que atravessasse a fúria,
a lamúria,
a penúria.

Para que batesse nas portas,
nas mortas
e em todas as idéias além das obras dos dedos
de minhas mãos.

Não por glórias ou memórias
(nem antologias ou filosofias,
nostalgias, hipocondrias,
idolatrias...)

Mas pra que levasse canção aos ateus
(e uma horda de cães aos teístas)

Para que levasse aromas, erotismos
e gozo aos puritanos

...E receitas de hóstia aos cães.

Para que tu lembres ao mundo,
que o final da brancura é a imundície.

Para que tu, filho selvagem,
me desobedecesse sempre
(e me negasse todas as vezes que dissessem meu nome).

Que recusasse minha roupa, minha comida,
minha casa, esposa e erudição.

E fosse simplesmente conspurcar da carne malévola
das casas da noite, cheias de prostitutas.

Para que se tornasse pai, mãe,
menino, menina.

Pois não vieste para mim,
mas por mim
(E para que eu esquecesse de mim!)

Para que eu me anulasse
para que eu me contradissesse.

Para que me superes,
(sendo, logo, mais do que eu sou)

E, quem sabes, assim acalmavas minha raça,
demasiadamente humano,
despojava, pirraça...

E de graça, me lembrava
de que todos os versos valem a pena.

De que todas as palavras são vida
e que todo poema, perverso,
é um violentíssimo atentado de amor.

(Imagem colhida em: http://amambanda.blogspot.com )

Tao Cão e tão só


Cão,
teus olhos e tuas orelhas
afirmam...

Não,
é tua saliva espumosa que,
louca,

Grão:
Sozinho ou em duna,
coaduna.

São
loucura pelas orelhas
e ventas.

Tão
nunca esqueço,
nunca aqueço

Solidão:
nem deus em sétimo dia se viu
tão e Tao,
hipocritamente,

Só.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

...Enquanto isso, na Idade Média

Neste fim de semana,

Show com a Banda

Bóris LaoBarenko e os Apátridas do Pensamento Hegemônico

Uma seleção especial, com repertório direto da Idade Média.


Serão três shows:
Sábado: 18hs e 21hs
Domingo: 18hs

O show marca o lançamento de uma nova bebida, que irá levá-los aos portões de Odin.... Ou ao Hagnarok!!!

É o Hidromel Mjölnir
Venha experimentar nossas músicas, saboreando um bárbaro hidromel!!!

Sábado e domingo
dias 06 e 07 de Agosto
no LAO BAR

Endereço e contatos:
http://bardolao.wordpress.com
http://twitter.com/#!/laobar

Slogorn!!!!!

segunda-feira, 23 de maio de 2011

OSWADIANDO


...E vinham vim-vindo
pirapotiando de alfaia
de batuque e tontô.

Recriando, ideiando,
como que em pera-lâmpada:

De tanto está lá plim-plim
de tanto cabeça-grávida
- rebanho de vaca mojando bestêra...

Gravô-grafô,
e... PIMBA!

Veio o deus-cego-cegalla
com a vareta de nominás-coisa
e benzeu-berrô de longe, de fôrça:
- Êêêêêêê.... Oswaldo.... É poesia, seu pôrra!

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Girassóis para Eloina


Das mulheres que amei na vida,
você foi a primeira e aquela
que jamais me perdeu de vista,
que suportou meu pecados com seu amor.


E quando um dia surgi de braços dados
junto àquela que disse minha e que tomei por única,
você aprendeu a amá-la, a fazê-la tua
fecundando girassóis, no fértil solo de minha mais intensa traição.


Aprendeste a amar tudo aquilo que amo,
à revelia de teu gosto, foi gostar do que gosto – e aposto:
amaste minha música e meus livros e as presunções de minha besta erudição.

Mamãe, tu és a prova máxima de que teimosia é virtude
e de que o amor não é pergunta, é resposta, é sentença:
A sentença definitiva, a certeza primeira de minha vida.

Meu beabá, minhas rimas, meu salário e minha bandeira,
Se dez corações tenho foi porque roubei-os de um pedacinho do teu.
Se mil vidas vivi, foi porque um dia me deste a primeira...

... E quando todas forem embora: minhas vidas e meus amores,
sobrarão meus versos, meus sonhos que um dia fui fecundar.

E em cada pedacinho haverá a marca de teus dedos (e por isso os frutos)
E em cada passo que eu deixar sempre haverá, porque antes semente você,
... Haverá o brilho dos teus girassóis.


Te amo mamãe.

domingo, 24 de abril de 2011

a Marte


As árvores são como dedos da terra,
são explosões verdes, filhas das sementes
lançadas como frutas, rumo ao palhaço bufo,
pelas mãos peludas de um espetaculoso deus.

O mar não tem escamas e as ondas são placas,
escudos a romper cortes contra a lua.

Os rios são artérias, e trazem os humores
do meu sangue e da minha doença.

Mas você é um super-herói (e a cristandade, sua cliptonita)
tens o poder da palavra com nojo
(mas fique tranquila, só eu vejo).


Os animais são monstros, são virus,
e o ser humano é bola nociva, noctívaga
a sobra e a sombra de todas as almas da terra.

Não adianta esperar o destino.
Se houvesse destino haveria ainda chance de previsão:
O problema não é não haver saída, o problema é odiarmos
com o coração de nosso bom gosto todas as saídas
que, certas, virão infalíveis como bruce lee.

E eu sou um marciano, um verde e inodoro marciano
simplesmente vitimado pela lua
que se afoga nas placas firmes dos mares de fogo:
Essa lua que escraviza que causa dependência...

...Se essa lua, se essa lua fosse minha
Eu escrevia nela seu nome,
eu me casava com as águas de fogo, dos rios dos mares
(porque o deus que fez as árvores, fez o mundo em 7 mares).

...Mas se essa lua essa lua fosse minha...
Quem sabe enfim eu mandava nas palavras,
e aí eu pegava,
e eu mandava no meu coração.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

THE ALPHA BETA PARKING LOT


Do alto do estacionamento alfabeta
vivo contando as estrelas, pateta.

No alto do estacionamento alfabeta,
sempre com um sorriso lavrado,
um pra cada carro parado,

Manobrando o sonho de tantos,
eu vivo sempre ocupado,
eu vivo, sempre ao volante.

Com o macacão todo surrado,
quem quer trabalhar no alfabeta,
vive sempre contente:

Não há quem só lamente,
A vida é um passeio dourado.

Contando em pisca-piscas,
o céu, todo estrelado,
No estacionamento alfabeta,
há sempre uma vaga, nunca faltou cuidado.

O pôr do sol como retrato,
se doze vidas tivesse,
e todos os sonhos pudesse...

Lá estava eu, eu e minha vida modesta...
...Com as estrelas ardendo nos olhos,
no alto do estacionamento alfabeta.

Certa vez apareceu uma perua,
uma palavra, numa fúria indiscreta:
dentro, com seu par de lábios vermelhos
ela lançou-me um olhar de penetra...

E abrindo-se a porta do carro,
suas lanternas de moça ninfeta,
quis ter-me no banco, ao lado,
sob o céu de uma estrela dileta.

Disse carecer de cuidado,
que o ardor é palavra direta
e no banco de um carropalavra

Saltou-me um furor feito lava,
um vulcão nos forjou em palavra,
nossas almas, só uma inquieta...

No alto do estacionamento alfabeta.

...E quem mais que fale do amor,
que comece esquecendo da dor...

E se lembre que no alto vulcão do desejo,
há um canto onde param palavras:
São aquelas que a mente deleta,

Elas estacionam possantes,
são palavras, motores arranques,
todas balizam e esperam...

Pelo trabalho preciso e galante
daquele que vive ao talante,
esterçando palavras: (proleta!)

O manobrista do vulcão que distante
tem por farol, as estrelas espertas
mora, tão perto e tão longe:
emparelhando palavras de amante...

Ao por do Sol eu amei, da cabine
cada palavra em um tom de profeta
quer seja um fusca, landau ou limusine
Eu sou o poeta do estacionamento alfabeta.

terça-feira, 22 de março de 2011

PROFISSÃO DE FÉ ou MEUNIFESTO ANTROPOCÓSMICO


Não, não mais teime.

É no mundo que faço versos.


Estou rodeado dessa massa asquerosa,

deste lodo quente modorrento,

deste modo surdo que me aplaca o gozo.


Quero sim,

Quero o mundo para além de mim,

Quero o eu pr'além daqui:


Mas não venha me dizer com teu sorriso hipócrita,

o que cabe ou não nos meus versos.


Não quero tua boca aguada,

teus lábios parados como num robô,

dizendo que me quer como letras em um refrigerador.


Eu quero a métrica mais selvagem e a mais formal, a mais formosa.

Quero a aritmética do verso em suas mais vorazes ataduras,

Em suas quadraduras mais gostosas,

Roçando meu teso em paixão.


Sou um poeta no mundo e não do mundo,

Sou um poeta do azul, do verso por excelência,

Mas não porque isso te agrada:


Por que faço sim o que quero...

E que o leitor vá gastar sua retórica de merda,

lambendo pastel em alguma padaria suja,

enquanto, currado por animais,

lava a bunda na pia batismal e histérica do modernismo de 22.


Meu decassílabo de pinto duro,

meu gosto, rosto armado até os dentes,

minha pica santa louca e bilac

com que navalho os sons de minha mente.


Eu quero reto o teto e largo o toldo

(quando todo lado feito é lodo seco

quero meu metro bobo todo gozo).


E feito pouco tanto quanto quero

meu verso rouco e rouca voz é louco

mundo pequeno de dizer eu quero


Insano é manto prá cobrir meu tosco

me centro todo e do teu lado quero

que de uma vez por todas o meu canto


seja mesmo livre pra mais que verbo

até que o metro que eu seja, pouco

até que louco eu penetre o quero.


Até que insano eu devore todo

verso arcano que me jaz funesto


Porque leitor,

meu pobre e pobre leitor...


Não há nem morte que me abafe o verso.

quinta-feira, 17 de março de 2011

COR AO SOM



Um poema,

um pomo,

um pedaço

redondo.



Um pombo

que volta

retrazendo

meu tom.


E num tomo

(revolto),

cadafalso

de ação,


Eu proponho,

eu tomo,

cem palavras

ao chão.


E retomo

e redomo,

Penso peito e choro:

Leão.


Se sou tolo

respondo:

é mais alto

meu tombo.


Se sou lago

escondo,

É mais falso

meu chão.


E se eu falo

me assombro:

tem mais calo

meu ombro.


Só não largo

meu pombo:

o meu som

Coração.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

AS REGRAS DA ARTE


Em 21 de fevereiro,
foi o poeta condenado à forca.

Era o final de sua vida de crimes,
dos seus atos lascivos,
de atentados e atentados à liberdade:

Os medíocres cantavam baladas,
Os incapazes champanhavam vitórias,
Os inúteis avançavam: quantas patentes acadêmicas!
Os funcionários tiritavam em gozo!

Diziam que o poeta enchotava a felicidade do mundo:
- Roubando palavras das bocas inocentes, ele as embebedava de beleza
até que as coitadinhas voltavam para casa de calcinhas arriadas,
chorando e chorando, molhadinhas, breacas de tanta música e rimas.

Sequer escapavam as palavras do dia-a-dia:
carro, buzina, metrô, barrinha de cereal...
E dizem,
que de um copo de leite, ele um dia fez uma flor!
E que numa fumaça de cigarro, ele fotografou um verso de amor:
- Sua poesia fazia mal à saúde.

Culpado em três instâncias: ministérios do trabalho, educação e saúde,
ele foi obrigado a acordar cedo,
a vestir a gravata,
a ler o evangelho
e a beber o sinal da cruz
(com o mesmo copo de leite com que ganhara
o Nobel de literatura).

Foi encontrado morto em sua cela
(já cogitava os rumos da bravata jurídica).
Em meio àquele sangue todo,
um poeta caído e um sorriso lavrado nos lábios...

Em seu peito,
3 Sonetos dançavam em roda,
e, à queima roupa,
7 redondilhas trespassavam, ensanguentadas,
o miolo mole de seu coração.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

BACANTO



"O amor, esse é difícil"
(A. Abujamra)


O desejo, faz-te rível
O amor, esse edifício.

E há que se galgá-lo,
a galgos longos, gordos, bem cachorros...

E lá no topo da escada
Escheriana,
banhado sob o céu d'estrelas
(das que encharcariam Orfeus e Dantes na boca do Inferno),

Havia que se lançar, em partituras, gotas e mais gotas de Beatriz.
(Sem elas, que seriam das florestas caducifólias de moinhos-de-vento?)

Ou, quem sabe, um soco bem dado:
e um soco bem dado,
é somente um soco só.

Já um soco melhor
é um socorro:
e mora nos quintais da poesia.

Um soco melhor ainda,
na boca desavisada do estômago faminto de Deus...

Bom...
Já isso é mais que um poema:
Chega ao mágico e graúdo estado
de Onomatopéia.

E a última vez que se viu pela Terra,
Ela bailou como champanha
nas bocas banguelas
de todos os Santos
nos seus dias de pecado e luxúria.

Chamaram-na cometa
e, bailando como água-viva,

Tomaram de assalto seu nome,
Tomaram aos berros seu corpo,
Tomaram de azul os seus olhos,
mas de nada adiantava.

Nem os portões da beleza celeste,
nenhuma palavra
emparedava sua louca fúria de gozo.

Nem sentença
Nem sorvete
Nem soberba
ou Satanás.

Sua cintilante cauda, o cometa,
Somente um poeta grafitando às pressas
na fria cera do escuro muro da História:

Em cada palavra, um conserto por sinfonia
Em cada santa maldita letra que eu via
Em cada ideia de cada palavra
morava somente um nome:

O Amor era Ele mesmo,
como em um concerto de Johann Sebastian Bach.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

COPO DE FÉ - XX Prêmio Moutounée de Poesia



Café expresso no meu copo plástico,
a fé expressa no teu corpo fátuo.
Cadê o néscio, o meu soneto vítreo,
para explicar o meu amor silábico?

O amor é tácito e o furor é cérebro;
escusa flácida em meu peito cínico
revólver verbo prá abater-me mântrico
ou beijo ácido e o torpor do sexo?


Se é este branco, em negra seta, alvo;
o lado oposto da palavra é verso
e se eu te explico que te quero é fácil.

Mas quando existo na caneta eu pênsil...
Prá cada ação da minha vida há um laço,
e em cada tom que não me verte é verso.

_______~oOo~____________

Este foi o poema com o qual conquistei, em Novembro de 2010, o Terceiro Lugar no XX Prêmio Moutonée de Poesia. Confesso, fiquei muito feliz! Primeiro concurso que concorro e já ganho $500!!! Quem diria? Rufem os tambores: Poesia enriquece!!!!! hahahah.

Enfim, foi muito legal ter o poema publicado em uma antologia e conhecer pessoas que se interessam por essa arte tão próxima, mas ao mesmo tempo, tão alienada do cotidiano.

Segue abaixo algumas fotos que pude garimpar na internet.
(Agradeço especialmente à Prefeitura de Salto e à Schoba Editora pela confecção do concurso e pela publicação e distribuição da obra e das imagens)














Mesa cheia de livros. Seu poema dentro. Para as outras coisas existe Mastercard!















Bom, no meio, todo sorriso e iluminado, eu mesmo e minha barriga velha companheira (estamos nos divorciando). Do meu lado direito da foto André Luiz Alves Amora e do esquerdo Sérgio Bernardo, respetivamente os 2º e 1º lugar no concurso.

Eis o grande prêmio de um evento como esse: conhecermos nossos pares. Localizamos, então, um tipo de gente estranha que gasta seu tempo combinando palavras. Escrever é uma atividade muito solitária e quando encontramos outros que se atrevem a tal solidão, somos tomados por um sentimento fraterno muito bom... Particularmente, eu chamaria esse sentimento de "humanidade".

Aproveitei a oportunidade e comprei o livro de poemas do Sérgio Bernardo. Jornalista de Nova Friburgo, ele busca no asfalto, na cidade não vista, em seus cantos e vielas, recriar a lira, reinventá-la, devolvendo à flor do chão, a flor do verso. Muito legal. Recomendo!

(BERNARDO, Sérgio. ASFALTO. Paraty, Selo OffFlip, 2010) - [O meu, já autografado...rs]

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Do Amor nos Tempos do Hoje


Não... A vida não é tão séria mesmo.

E, ainda assim, há de haver ternura, carinho...
E um pouco de desconfiança.

Quando o destino nos surpreende, e nos apresenta alguém,
Nós imediatamente perguntamos sobre os possíveis caminhos que a vida nos trará:
"Seremos felizes?"

Mas é claro que seremos felizes! Não há porque temer!

Afinal, ser feliz não é viver em festa!
Ser feliz é debater-se com o mundo.
Ser feliz é ter a persistência pela palavra...


É ter certo que um bom poema (e viver é o mais incerto dos poemas)...
...Só se pode ser declamado assim:
Como quem escreve com os próprios passos,
Com o nosso teimoso caminhar, sempre como quem celebra uniões, vitórias e encontros.

Que esse caminhar nunca nos deixe esquecer que ternura é,
Mesmo,

Um sinal de fortaleza...

E que respeito e amizade são coisas que se constroem
Sempre em união com os outros.

Não. A vida não é séria.

Ela é uma comédia a ser vivida, como quem passa desatento pela rua.

E ainda assim...
Desatento como quem nunca se esquece daquilo que mais importa:
De que o ser humano foi feito para estar junto.


É óbvio que quando menos se espera, tudo pode parecer complicado.
Ah... Mas viver com desafio é mais gostoso!

Viver só se torna relevante quando tomamos uma boa dose de displicência
(Na verdade não é displicência: é confiança na própria vida).

Talvez nem a vida exista por si mesma!
Talvez ela seja uma invenção nossa:
A mais gostosa e engraçada invenção que as pessoas já fizeram em suas existências.

E o resto?
Então não há mais nada do que a invenção na cabeças das pessoas?


Há sim:
E se chama amor!