sexta-feira, 16 de setembro de 2016

MONTAGNER

Morreu mais um palhaço,
deixou entre as montanhas
uma sereia.

E sereia é coisa séria.

Sempre desconfiei daquela lágrima pintada na cara dos palhaços.

O palhaço mora dentro daquela lágrima.

Ele é o paraíso das crianças e tem,
contudo, o dom terrível do susto.

Ele é o dono dos balões que fazem flutuar os amadores
os poetas
os sonhadores.

Todos os palhaços não cabem numa só criança.
tampouco um palhaço só.
mas palhaço é só.

O palhaço tem sempre aquele ventilador do filme.
O ventilador é também uma sereia.

Quem me dera ser palhaço e me afogar dentro daquela lágrima,
fazendo o mundo girar e dançar, feliz, sob o canto ventilador
daquela sereia.

Aquela lágrima retumba na minha cabeça em todo o poema que escrevo.

Lembrando que em toda graça, em toda risada alcançada,
há uma gota de rio...

Um rio Santo,
porque se rio por último
- dentro d'água daquela lágrima - 
rio melhor.

As vezes, nos balões em que flutuam amadores,
tem palhaços,
tem padres.

Se só rio
é porque a vida é uma operação dialética
que resulta no palhaço, o Santo,
e no padre, o palhaço.

Santo, Palhaço, Rio, Sereia:
em tudo, ávida, há vida.

É preciso rir (eu rio!)
diante das tragédias,

Aprender com aquela lágrima estampada na cara do palhaço.

... Porque palhaço também é coisa séria!

É a gente que escolhe se os balões carregam
palhaços (do bem ou do mal), padres, sereias
ou um ventilador.

Entre o rio e a montanha,
perdemos o palhaço Santo.

É preciso ir além,
porque se mergulhar na lágrima,
eu mergulho, eu rio.

Eu Rio pralém da Montanha,

E pralém da Morte,
Montagner.

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Imagem extraída de: http://www.gazetadopovo.com.br/caderno-g/tv/montagner-foi-palhaco-de-circo--e-mais-coisas-que-voce-nao-sabia-sobre-ele-5cp5f9abhfz6ywqfdwctcam12 

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

NESTA ANTESSALA DOS AUSENTES


               
                             (para Marcos Siscar) 

A vida é carta a vida é sê-lo e a poesia a maldita mensagem na garrafa como disse o poeta amigo meu 

Eu não aguento mais! Não mais esse Eu estampado no começo do verso Nem essa tua mania de achar – porque tu o exiges! –  de que o poema tenha que dizer eu sinto


Mas caio (Eu não mais) nessa armadilha e sigo como um toque de Merdas porque de Midas é que não iria ser ora bolas quem foi que colocou em mim esse mar de espinhos em minha costa em meu rosto em minha língua morando dentro de minha cabeça... porque tenho espículas que estilhaçam até meus tornozelos cansados dessa idade velha com a qual já nasci Ranzinza ranzinza e o poeta nasceu prá ser bardo Chatotorix em Goscinny/Uderzo é obvio que ele queria ser amarrado, nem ele mesmo se quer suporta a pieguice de sua lira


Guitarras deixadas de lado garrafas de cerveja abertas boiando naquela água gelada depois do churrasco overdrive aguardando um socorro incapaz sequer de uma flutuação nessa época de tantas enchentes o que houve é que eu não sei nada nunca soube e continuo sem saber


Aí corro (puta vontade de esconder meu eu no a gente) pro facebook e vejo todo um coro de selfies entoando – são anjos de Bernini – a miséria da minha voz enquanto teimo em me lembrar que a única verdade é que a vida é um GIF, um eterno retorno do mesmo que me lembra que a gente (Ou eu?) perde pro final, depois de matar o chefão na última fase


Entre o a gente e o paciente sou obrigado a arrastar meu cadáver cheio de mortos meu corpo cheio de versos (Já disse que o único lado que interessa é o verso, não?) enquanto finjo que like ou share alguma coisa enquanto uma plateia sedenta espera por outros nudes que não este obviamente aí vejo uma postagem do Bauman que diz que rede social é um engodo só consigo imaginar dois burros ofendendo-se à dentadas acusando um ao outro “Seu... Fábio!” “Seu... Poeta!” Triste é o Bauman que virou meme Depois que deus enterrou o último Nietzsche fico cutucando meu nariz e sinto um gozo secreto por não ser o último homem miserável


Eu já me cansei de você você diz Isso se e somente se na equação prosaica de meus versos o meu poema se tornar a mística metafísica narrativa em segunda pessoa. aonde aperta o reboot? Aaaahhhh... Tela azul da minha vida... Fará o face minha voz colorida? Nem Raimundo, nem rima completo mais um ciclo de certezas e desta vez vai


                                                            Do céu/mainframe escuto:


Diante da alta demanda de poetas com diferentes problemas clínicos, implementamos o sistema de classificação de risco para assegurar que o atendimento seja realizado por gravidade poética e não por ordem de chegada


                                                                     Poesia é imagem
                                                             
                                                                       a vida é.JPEG